Nos últimos tempos vejo cada vez mais companhias renomearem a função de “Gerente de Produto” como “Gerente de Marca”, tentando aparentemente dar um upgrade à mesma. Isto é correto? Seria o Gerente de Marca ou Brand Manager um Product Manager que “tomou esteroides”? Isto demanda alguma reflexão.
Primeiro, a definição: “Uma marca é um nome, termo, símbolo, design, ou combinação destes elementos que identificam e diferenciam um produto de uma companhia de seus competidores”1.
E de onde vem a palavra marca ou brand? Em inglês, brand vem do verbo to brand que significa “marcar (gado) a ferro quente”. A marca deixada no couro do animal significava a quem pertencia o bicho – a que fazenda ou fazendeiro. Ao longo do tempo a marca no couro passou a ser uma espécie de certificado – animais que vinham de certos criadores eram preferidos pela alta qualidade representada pela marca.
No final do século XIX, a prática de branding migra dos pastos para o mundo do comércio. Os nomes de certas companhias ganham prestígio e conteúdo e as mesmas passam a imprimir na embalagem dos produtos suas marcas. Até então o nome dos produtos era o que importava. O nome e o trademark de certas companhias haviam se estabelecido na mente do consumidor passando a significar “algo” (qualidade, personalidade, confiança, tradição) e a oportunidade de transferir esse significado para novos produtos da mesma empresa, ou a produtos menos bem-sucedidos era irresistível. Aqui um detalhe importante: a marca nesse momento cumpre uma função proteger o produto de cópias e impulsionar a venda. A filosofia de Marketing passa a existir apenas nos anos 50.
No início do século XX, a Bayer lança no Brasil o slogan “Se é Bayer, é Bom”. Esse slogan compacto tinha o respaldo da qualidade dos produtos da marca Bayer, já reconhecida então pelo mercado. Era uma profecia autorrealizável que emprestou a imagem de qualidade a toda a gama de produtos da companhia, desde um medicamento como a Aspirina até a um produto de consumo como o inseticida Baygon, passando por um parasiticida veterinário: o Baymec. Todos eram Bayer, logo todos eram de alta qualidade.
Outro fenômeno: certos nomes de produtos ganham protagonismo ao longo do tempo e se tornam o próprio nome da companhia, como a Coca-Cola. E eles viram uma marca, estabelecendo-se na mente dos consumidores com toda uma gama de “significados” e “signos”: um formato, uma cor, um ícone, um som, um logotipo, uma personalidade, um sexo.
Coca-Cola é uma marca, um guarda-chuva robusto que abriga muitos produtos. Pode ter certeza de que existe Gerente de Produto até para a temida Diet Cherry-Orange-Vanilla Coke. Assim como existe Gerente de Produto para Coca-Cola em lata e outro (a) para Coca-Cola em garrafa. Permanece um mistério a existência de um profissional de marketing que cuide exclusivamente da marca, etérea e desincorporada de qualquer produto.
A consequência dessa ponderação é que não podem existir tantas marcas quanto produtos. Poucos nomes de produto e companhia se tornaram autênticas marcas que ocupam um lugar único na mente dos consumidores e ganham significado. Consigo pensar em alguns produtos farmacêuticos cujos nomes podem ter chegado a ser “marcas” ou perto disso. Me ocorrem: Novalgina, Nexium nos EUA (“the power of the purple pill”), Viagra, Botox.
Ao ler este último parágrafo alguém pode ter a impressão de que um produto ganha
importância até que “vira” uma marca, mas não é essa ideia. A questão do que seria mais
importante, a marca ou o produto é parecida com “o-que-veio-antes-o-ovo-ou-a-galinha”. Este é um tema importante e que demanda espaço e será abordado num próximo artigo.
Com base na linha de pensamento que estamos seguindo, os termos “Gerente de Produto”
ou Product Manager me parecem os mais corretos para identificar a função. Outro ponto para refletir: a importância do Product Management é tão grande que existe nos EUA a Association of International Product Marketing and Management (AIPMM) que certifica profissionais após um processo exigente. Que eu saiba, não existe nenhuma Association of Brand Management.
Detalhe: nos EUA existe a figura do Product Manager, que cuida da concepção de um produto e também o Product Marketing Manager, que está mais próximo da posição de Gerente de Produto que conhecemos no Brasil.
Todos nós deveríamos ter mais orgulho do título Gerente de Produto. Quando compreendemos o verdadeiro escopo da função, podemos trazer um impacto fabuloso para os negócios de nossas companhias. Tenho muitos exemplos que me confirmam essa crença.
Trabalhou na minha equipe um Gerente de Produto que, com um insight que teve, levou as vendas anuais de uma apresentação de um produto de R$ 600 mil para R$ 12 milhões. Note bem: uma apresentação! Sem falar no que o produto também cresceu. Calculei o ROI desse Gerente de Produto levando em conta tudo que a companhia havia investido nessa pessoa durante 15 anos, salários, treinamento, benefícios, etc. Aí coloquei somente os lucros que esse único insight trouxe para a companhia. A Taxa Interna de Retorno desse Gerente de Produto para a companhia foi de 49.6%, com um Net Present Value de R$ 27.9 milhões… com uma ideia apenas.
Não é à toa que o Chief Marketing Officer da Mozilla, Jascha Kaykas-Wolff, quando
perguntado sobre a função mais crítica nas companhias, respondeu: “Sem dúvida o Product
Marketing Manager (Gerente de Marketing de Produto) … caso fosse recomeçar minha carreira, começaria no gerenciamento de produto”.
Este último é um termo que me agrada mais: Gerente de Marketing de Produto. Para mim
esse é um termo mais preciso, mas se alguém se sente mais importante sendo chamado (a) de “Gerente de Marca” não vejo problema algum. É necessário, no entanto, que tenha muito claro para si o que significa verdadeiramente o conceito de Marca.
Informações do Autor
Antonio Cesar Rodrigues
Conta com mais de 30 anos de experiência em Marketing, havendo trabalhado em multinacionais em posições executivas nacionais, latino-americanas e globais. Marketing é sua área de expertise, com ênfase em Planejamento Estratégico, Pricing, Comportamento do Consumidor, Business Intelligence, Efetividade de Marketing & Vendas e Marketing Finance. Cesar é Managing Partner da Promktg – Excelência em Marketing, consultoria fundada por ele, cuja missão é “desenvolver profissionais de marketing extraordinários”. Ele tem o título de Master of Science em Marketing pela John Sykes College of Business, na University of Tampa (Flórida) e pós-graduação em Marketing pela Fundação Getúlio Vargas (Brasil). Atuou como professor do MBA Internacional da Profuturo – FIA, em São Paulo, onde ministrou as disciplinas de Marketing Intelligence e Consumer Behavior e também na pós-graduação das Faculdades Oswaldo Cruz no curso de Precificação para Produtos Farmacêuticos. Atualmente ele reside nos EUA onde é professor da cadeira de Marketing na University of Tampa.
cesar.rodrigues@promktg.com.br
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Key Words
– Brand Manager
– Gerente de Produto
– Gerente de Marca
– Marketing
– Product Manager